A Democracia existe e é valiosa para nós.

A Democracia existe e é valiosa para nós.

2023 começou inspirador, com um leve perfume de esperança, que há alguns anos a gente não sentia no ar. Isso graças a democracia. No dia 1 de janeiro confirmamos de uma vez por todas o resultado da eleição presidencial, numa posse cheia de simbolismo, diversidade e grandes discursos. Mas foi um discurso feito no dia 3 de janeiro que realmente encantou todo mundo: o discurso de posse do ministro dos direitos humanos Sílvio Almeida. Jurista e filósofo, Almeida tem 46 anos de idade, é negro e é uma das mais brilhantes e ativas vozes no país contra o racismo e direitos humanos do Brasil. Seu discurso emocionado bradando que todas as vidas são valiosas e importam para o governo que assume o poder neste ano é muito revelador. E acabou inspirando a Strip Me a criar a camiseta Valiosos, uma peça minimalista linda, super estilosa, que retrata muito bem o momento em que vivemos.

Daqui 2 anos, em 2025, vamos comemorar os 40 anos da redemocratização brasileira. Em 1985 Tancredo Neves assumiria como o primeiro presidente civil depois de 20 anos de uma ditadura militar obscura. Tancredo adoeceu e foi internado na véspera de sua posse como presidente, 14 de março de 1985. José Sarney, seu vice, acabou sendo empossado, e Tancredo, após passar por 4 cirurgias, acabou falecendo no emblemático dia 21 de abril. Desde então, vivemos plenamente amparados politicamente pelas mãos da democracia. Mas não pense você que foi fácil assim.  Aliás, ao longo da nosso história, o que a gente menos teve foi facilidade para ter governos dispostos a garantir recursos e liberdade ao povo. Para você ter ideia, desde o fim do império e o estabelecimento da república, em 1889, nós passamos por 5 golpes de estado (incluindo a própria proclamação da república, que foi um golpe militar e o impeachment de Dilma Russeff, que não foi militar, mas foi um golpe que a tirou de o poder). E isso porque não estamos contando com as tentativas de golpe frustradas. Ao longo desses 133 anos de república tivemos 4 constituições promulgadas, a última, em vigor até hoje, é de 1988.

Mas, pensando nos acontecimentos recentes no país, vamos focar no que aconteceu de 1984 pra cá. Antes só um breve resumo do que acontecia anos antes. Em 1975 o então presidente Ernesto Geisel anunciou que tinha a intenção de dar início ao abrandamento da ditadura, a tal da abertura democrática. Em 1977 aconteceu a primeira manifestação popular contra o governo desde 1968, quando o AI-5 foi instaurado. Essa manifestação foi a enorme, e heroica, greve dos metalúrgicos no ABC paulista liderados pelo Lula. Os grevistas reivindicavam não só melhores condições de trabalho, mas também mais liberdade. Em 1979 assume a presidência João Figueiredo, que é quem realmente inicia a abertura política com a lei da anistia, a volta dos presos políticos e a permissão para que novos partidos políticos fossem criados. Nascem assim o PSDB  e o PT, que encabeçam movimentos exigindo eleições diretas. Em 1983 o deputado federal Dante de Oliveira dá entrada no congresso a PEC (projeto de emenda constitucional) que estabelecia eleições populares diretas. No dia 25 de abril de 1984 o Brasil parou para acompanhar a votação da PEC. Eram 479 deputados que votariam, sendo que eram necessário 320 votos favoráveis, ou um terço do plenário, para que a PEC fosse aprovada e o Brasil tivesse eleições para presidente. Acontece que, por manobras dos políticos que apoiavam a ditadura, houveram muitas abstenções e faltas. A PEC teve 298 votos e não foi aprovada.

Quando a emenda do Dante de Oliveira foi por água abaixo, o Brasil pegou fogo. Se intensificaram muito as manifestações e o movimento Diretas Já tomou proporções gigantescas. Vale lembrar aqui que essas manifestações já ocorriam desde 1980, depois do Figueiredo aprovar a lei de anistia e afrouxar um pouquinho (mas bem pouquinho mesmo) a censura. Acontece que entre 1980 e 1981, a linha mais radical dos militares, que não queriam saber de abertura politica nenhuma, começaram a agir. Esses militares começaram a plantar bombas em bancas de jornal que vendiam publicações “subversivas” como O Pasquim. E eles faziam isso pintando no lugar onde colocavam as bombas a sigla VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), um grupo de guerrilheiros de esquerda que atuaram nos anos 70 combatendo a ditadura. Mas todo mundo sabia que aquelas bombas eram coisa dos militares, e essa situação explodiu (literalmente) mesmo no dia 30 de abril de 1981, durante uma manifestação que contava com vários shows musicais no Rio Centro, no Rio de Janeiro. Um coronel e um capitão do exército planejavam explodir duas bombas durante os shows, no meio da multidão mesmo. Mas uma das bombas explodiu por acidente no estacionamento, dentro do carro, onde estavam os dois militares! Foi um escândalo que só piorou a situação dos militares, já que se comprovou que eles promoviam violência, enquanto as manifestações pela democracia eram pacíficas. Entre 1980 e 1981 foram exatamente 28 bombas explodidas em Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo, a última delas foi a do Rio Centro, que matou justamente os dois autores do atentado.

Depois do atentado frustrado no Rio Centro, mais e mais manifestações populares se espalharam pelo Brasil. Cada vez mais o movimento Diretas Já ganhava respaldo de políticos, intelectuais e artistas de muita relevância. No esporte também havia um apoio enorme, que ajudou a popularizar ainda mais o movimento. Pelé saiu na capa da revista Placar com uma camiseta escrito Diretas Já enquanto os jogadores do Corinthians, time mais popular do estado de São Paulo e um dos mais populares do Brasil, instauravam a Democracia Corinthiana. Tudo isso culminou na maior manifestação popular da história do Brasil, quando aproximadamente um milhão e meio de pessoas tomou o vale do Anhangabaú em São Paulo para um comício histórico. No palanque políticos como Ulysses Guimarães, Lula, Fernando Henrique Cardoso, Leonel Brizola, Miguel Arraes, Mário Covas, Franco Montoro e outros, além de artistas como Fernanda Montenegro e Fafá de Belém e representantes da Democracia Corinthiana, Sócrates e Casagrande. Até então, o Brasil nunca tinha visto uma manifestação tão numerosa. Tendo acontecido apenas 9 dias antes da votação da PEC de Dante de Oliveira, quando a emenda foi derrubada, Figueiredo mandou reprimir quaisquer outras manifestações, e muitos confrontos entre polícia e manifestantes passaram a acontecer.

O movimento Diretas Já era, em essência, uma manifestação de apoio à PEC de Dante de Oliveira. Quando ela foi derrubada no congresso, ao invés do movimento perder fôlego, se inflamou ainda mais, agora exigindo a redemocratização de qualquer maneira. E no fim do ano de 1984 seria escolhido pelo colégio eleitoral, ou seja, pela classe política, o sucessor de Figueiredo, já que o mandato de presidente até então era de 5 anos. Naquele ano admitiu-se pela primeira vez desde 1964 um representante civil para se candidatar a presidente. Neste caso, Tancredo Neves. Em cima da hora, o candidato dos militares, o coronel Mário Andreazza, abriu mão da candidatura e acabou sendo substituído por outro civil, mas bem conservador e ligado à direita: Paulo Maluf.  A eleição aconteceu no dia 15 de janeiro de 1985 e Tancredo Neves saiu vitorioso. No mesmo dia, no Rio de Janeiro acontecia o primeiro Rock In Rio, e foi muito marcante a cena do Barão Vermelho tocando Pro Dia Nascer Feliz na madrugada de 15 para 16 de janeiro, todo mundo sabendo, e comemorando, que o Brasil finalmente tinha um presidente civil eleito e que a ditadura militar chegava ao fim.

E mesmo com todos os problemas econômicos e crises políticas, a gente foi tomando gosto pela democracia. José Sarney, o vice de Tancredo Neves, governou o Brasil de 1985 a 1989, quando, aí sim, houveram eleições diretas, e o presidente do Brasil foi escolhido pelo povo. E que eleições foram aquelas! Até o Sílvio Santos chegou a se candidatar, mas o nome dele não poderia aparecer na cédula! Os dois principais candidatos eram Fernando Collor de Melo, um playboy alagoano que se dizia caçador de marajás, e Luís Inácio, o Lula, sindicalista de São Bernardo do Campo e líder do Partido dos Trabalhadores. Até hoje o debate entre Collor e Lula para o segundo turno na Globo é estudado nas faculdades de jornalismo. O debate não era ao vivo, foi gravado e editado. A Globo defendia abertamente a eleição de Collor e fez uma edição criminosa no debate favorecendo seu candidato. E ajudou muito. Collor foi eleito. Mal entrou no poder, em 1990, e já confiscou poupança dos brasileiros e saiu fazendo lambança atrás de lambança. Enquanto via sua popularidade despencar o presidente era bombardeado por acusações de corrupção por parte de seu irmão e de vários jornalistas, que investigavam os negócios obscuros de PC Farias, amigo íntimo e principal assessor de Collor.

Em 1992 rolava na Globo uma série que fez muito sucesso, chamada Anos Rebeldes, que contava a ação de jovens estudantes nos anos 60 contra a ditadura militar. No dia 29 de maio de 1992, a UNE (União Nacional dos Estudantes) convoca uma manifestação em São Paulo que tem uma adesão surpreendente, milhares de pessoas, a maioria jovens estudantes universitários. A manifestação pedia melhores condições de estudo e o fim da corrupção na política, entre outras coisas.Essa foi a primeira de muitas manifestações, e tornou-se famoso um cartaz na multidão que dizia: “Anos Rebeldes, O Próximo Capítulo”. A UNE passou a organizar cada vez mais manifestações, estimuladas pela CPI que fora aberta no dia 1 de junho para investigar as acusações de confisco, corrupção e pagamento de propinas contra o governo Collor. No dia 11 de agosto, mais de 10 mil pessoas lotaram o vão do MASP, na avenida Paulista para pedir o impeachment de Collor Para deixar claro o apartidarismo da manifestação, os jovens tinham seus rostos pintados de verde amarelo (bons tempos em que essas cores eram usadas para defender a democracia). Dois dias depois, Collor faz um pronunciamento em rede nacional dizendo que a mídia estava manipulando  as informações (!) que ele estava sofrendo falsas acusações (!!) e pedia que, para mostrar que o povo brasileiro não estava contra ele, como dizia a mídia, todos saíssem às ruas no domingo seguinte, dia 16, vestindo roupas com as cores do Brasil (!!!). Olha, parece que foi ontem que ouvimos uns discursinhos bem parecidos… mas o que aconteceu foi que milhares de pessoas em vários capitais do Brasil saíram ás ruas vestindo roupas pretas e com a cara pintada de preto! Foi o movimento que ficou conhecido como os caras pintadas, e que ajudou muito a fazer com que o impeachment de Collor fosse aprovado. Malandramente, Collor renunciou ao cargo antes de ser cassado e manteve seus direitos políticos. Tanto que depois se elegeu senador por Alagoas! Sim, teve gente que votou nele depois de tudo! Mas isso é outra história.

Enfim, este texto de hoje é sim uma celebração à democracia e à liberdade. Todos nós da Strip Me desprezamos todo e qualquer ato golpista contra a democracia, bem como manifestações violentas, vandalismo e, em especial, a depredação de obras de arte. O que aconteceu no último domingo, dia 8 de janeiro, foi um horror. Ainda bem que temos pela frente 4 anos com gente como o Sílvio Almeida e a Marina Silva do nosso lado, ajudando a comandar o país. É um governo que está longe de ser perfeito, tem seu lado questionável, mas pelo menos tem humanidade e apreço pela cultura, pela diversidade, pelo meio ambiente e pela liberdade. Assim como nós! Então você pode começar 2023 dando uma geral na nossa loja e conferindo os lançamentos, como a camiseta Valiosos, além das camisetas de música, cinema, arte e cultura pop.

Feliz 2023!

Vai fundo!

Para escutar: Uma playlist de protesto! Músicas que falam sobre democracia e contra governos autoritários! Música de protesto Top 10 tracks!

Para assistir: A TV Senado produziu um documentário bem legal sobre as Diretas Já, chamado Diretas Já – O Grito das Ruas, com depoimentos de várias pessoas que participaram das manifestações, de Lula a Fernanda Montenegro. Vale muito a pena conferir. Tem completo no Youtube, só clicar aqui.

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