MTV 40

MTV 40

Se um artista ou banda quer se destacar e arrebanhar fãs, ou seguidores, é impensável que uma canção seja lançada nas plataformas digitais sem que haja uma veiculação simultânea de um videoclipe da mesma canção no Youtube e redes sociais. Um cenário que em absolutamente nada se assemelha ao que ocorria 40 anos antes. Até o mês de agosto de 1981 o artista ou banda estava totalmente nas mãos e uma grande gravadora, que produzia um disco caríssimo, investiria mais uma quantidade obscena de dinheiro em publicidade com anúncios em revistas especializadas, cartazes e totens para lojas de discos e “um cafezinho” pro DJ que tocasse as músicas no disco no rádio. Videoclipe? Nem pensar! Na real, nem existia direito esse conceito. Pouquíssimas bandas apostavam em produzir um vídeo conceitual para acompanhar o lançamento de uma canção. Mas os anos 80 tinham chegado pra ficar, e alguma coisa precisava mudar.

No dia 1 de agosto de 1981 entrou no ar um novo canal na televisão norte americana. Sua estreia aconteceu com cenas do lançamento da Apollo 11 e dos astronautas na lua. Quando a bandeira norte americana é fincada em solo lunar, as listras e estrelas somem encobertas por um fundo colorido e, sobre ele, as letras M, T e V se sobrepunham. O canal Music Television foi criado pelo produtor de TV Robert W. Pittman, que era funcionário anteriormente da Warner. Pittman viu que havia toda uma geração de adolescentes que consumiam música e não tinham nada na televisão que os agradasse, a programação se resumia a programas infantis para crianças pequenas e jornalismo e entretenimento para adultos, o adolescente ficava no limbo. A princípio o canal transmitia shows de bandas dos mais variados estilos do pop e rock e alguns poucos clipes que já existiam, tudo intermediado por VJs jovens e descolados, que falavam diretamente com a molecada. Tudo era muito colorido e meio anárquico. Foi um tiro certeiro. Em pouco tempo, a MTV já era uma febre entre os jovens.

O conceito estético do canal foi elaborado com muito cuidado, pensado em cada detalhe. O trampo ficou por conta de um escritório de design gráfico chamado Manhattan Design, um coletivo de designers de New York, que funcionou entre os anos de 1979 e 1991, o projeto é creditado a Pat Gorman, Frank Olinsky, Patti Rogoff e ao primeiro diretor criativo da MTV, Fred Seibert. O Manhattan Design já trabalhava com música projetando capas de discos e cartazes de shows da cena blues e jazz nova-iorquina. O que mais chamou a atenção na época foi que a identidade visual da marca não apresentava uma cor ou uma paleta de cores. Uma vez que se tratava de televisão, modernidade e ritmo, os criadores propuseram que a marca mudaria de cor a todo momento, um conceito nunca utilizado até então. Além disso, foram responsáveis por criar vinhetas e aberturas de programas, que ficaram marcados pela pluralidade, uma Pop Art em movimento, com cores e recortes. Mesmo depois do escritório encerrar suas atividades em 1991, o mesmo conceito seguiu firme no canal e foi aplicado em outros países.

Artistas antenados e notoriamente mais performáticos viram nos videoclipes uma oportunidade de enriquecer suas criações musicais e aumentar sua popularidade entre os jovens. Bowie, Michael Jackson e Madonna entraram de cabeça nesse mundo. Até a metade dos anos 80 o pop dominou o canal. As coisas realmente começaram a mudar em 1988 com o sucesso avassalador de Sweet Child O’Mine, dos Guns N’ Roses. Um clipe modesto, simplesmente mostrando a banda tocando num estúdio de ensaios, mas muito bem filmado e com todo o poder da canção em si. Dali em diante, o rock se faria cada vez mais presente, até culminar com mais uma bomba que cairia sobre a música pop três anos depois, com um trio esfarrapado vindo de Seattle. É, o grunge, de maneira geral, virou tudo de cabeça pra baixo, inclusive a MTV. Com todas essas mudanças e a MTV cada vez mais influente, as gravadoras investiam cada vez mais em videoclipes, que começavam a ter orçamentos cinematográficos. Aliás, a linguagem de videoclipe influenciou muito o cinema que seria produzido nos anos 90. E mais, à partir de 1992 a MTV passou a incluir nas informações do clipe apresentado, no início do vídeo, o nome do diretor responsável. Foi quando começamos a nos familiarizar com nomes como Spike Jonze, Michel Gondry e David Fincher, que depois se tornariam grandes diretores de cinema.

A MTV contribuiu muito para a modernização da televisão de maneira geral. Seja na linguagem mais coloquial e direta, na estética camaleônica e vibrante, ou no comportamento, apresentando um humor auto crítico e anárquico. A personificação dessa atitude toda veio através do desenho Beavis & Butt-Head. Dois moleques toscos que criticavam os clipes que o canal passava com um humor deliciosamente mordaz. A dupla ganhou o mundo e chegou a virar filme. Com certeza uma das mais brilhantes criações do canal.

Se você tem mais de 30 anos de idade com certeza deve estar se perguntando se a gente não vai falar do Disk MTV, Do Fúria Metal, do Teleguiado, do Gordo A Go Go, do Rock Gol… pois é. A MTV brasileira entrou no ar em 1991 e tem uma história tão incrível e deliciosa que merece um post só pra ela. Por isso, desta vez vamos nos ater à MTV norte americana, que acabou de completar 40 anos. 40 anos que mudaram o mercado musical incorrigivelmente.

Como uma profecia, após a bandeira com a logo multicolorida da MTV ser fincada na lua inaugurando o canal, o primeiro clipe a ser veiculado foi Video Killed the Radio Star, dos Buggles. Nascia uma nova era. Multimídia, mutante, provocadora, libertária. Com certeza a MTV é uma influência imensa, que faz a Strip Me ser a empresa que é hoje. Antropofagia rock n’ roll, liberdade em movimento, diversão & arte.

Vai fundo!

Para ouvir: Uma playlist com o que rolou de melhor na MTV norte americana entre 1981 e 1990, uma música de cada ano. 10 tracks MTV US.

Para assistir: A MTV não surgiu do nada. Desde o início dos anos 60 já rolavam filmes com músicas e tal. Mas o clipe como conhecemos hoje surgiu das mãos de Richard Lester, o jovem diretor britânico que dirigiu o primeiro filme dos Beatles, A Hard Day’s Nght. No filme é possível “recortar” as cenas musicais e vê-las como clipes. Em especial a música Can’t Buy Me Love tem uma estética de videoclipe inacreditável para a época. O filme é de 1964 e é divertidíssimo e deve ser visto por todo mundo que curte música.

All That Jazz!

All That Jazz!

Pra começar, é tudo.

Liberdade, sentimento, fluidez, ritmo, história, mistura, quase nenhum ou total excesso de estudo. Se parar pra pensar, é realmente o começo, a revolução popular em cima do erudito. Mas não é assim, de qualquer jeito, qualquer nota, fora do tempo, da pauta ou do espaço. Tem que ser a nota certa, a nota azul que dá a intenção, o frisson, a emoção, muito bem colocada. Se há padrão, é melhor quebrar ou expandir. Sem perder o ritmo, o chimbau que abre e fecha no compasso, um trem chiando ao longe sobre a linha do tempo. Parece confuso, eu sei, mas tudo se encaixa. Traduzindo na língua universal da música, fica mais fácil. It’s all that jazz!

Sem perder o ritmo, seguimos na linha do tempo. Tudo se mistura, lenda e realidade, trabalho e arte, história, geografia, vida e morte. O sul dos Estados Unidos no fim do século dezenove não era nada fácil. Ainda mais pra quem era preto, filho de escravo. Via na plantação de algodão um destino inevitável, não tinha vodu, bourbon ou honk tonk que remediasse. O jeito era cantar na lavoura e na igreja. Lamentos, spirituals, expressão de tristeza negra na essência, na falta de melhor palavra que trouxesse luz, nasceu o blues. Arkansas, Delaware, Georgia, Mississippi, o som se espalhava pelas planícies feito grama, até que achou residência fixa em New Orleans, Louisiana.

As vastidões das planícies, das plantações de algodão, depois, com as cidades crescentes, movimentadas e, claro, sempre segregadas, não tinha como o blues ser uma coisa só. Foi se multiplicando. Swing, be bop, isso bem no comecinho. Depois virou jazz pra valer, free jazz, soul music, funk, hip hop e R&B. Se espalhou mesmo. All that jazz, é tudo! Música, sofisticação, improviso, ato político. Nunca é só música, tem sempre um algo mais, um impulso. Mas não vamos perder o ritmo, ainda estamos no princípio. Nos honk tonks, que eram os bares e bordéis para negros com música ao vivo. Mas o jazz indomável não se prendia a um simples quartinho e ia pra rua, através de garotos tocando juntos na calçada, um deles, inclusive, vai ficar mundialmente conhecido, Louis Armstrong e seu trompete fantástico. E ainda nem chegamos em 1920. Então vamos acelerar o beat.

Pops, como era conhecido o Louis Armstrong, saiu das ruas pra ganhar o mundo, e revolucionar, popularizar, o jazz no meio do caminho. Foi o primeiro a montar uma banda com músicos pretos e brancos na mesma formação, ganhou as telas de cinema e encheu as ondas do rádio de grandes canções. Na sua cola vieram Billie Holiday, Ella Fitzgerald, Ray Charles, Dizzy Gillespie, Charlie Parker, Miles Davis, Coltrane, Duke Ellington… sem falar em Sinatra, Tony Bennett, Nat King Cole. Cara, realmente o mundo mudou depois de New Orleans e seus honk tonk boys and girls.

Dito tudo isso, se você ainda pensa que o jazz é só uma cornetinha solando num ritmo quebrado de três compassos ou cinco, se situa! O jazz é a música moderna na essência. É música negra folclórica, é música erudita europeia, ópera e o diabo, tudo junto e misturado. Desde os terrenos encharcados de New Orleans ao blues elétrico de Chicago. Do jazz veio o diabo cristão do rock, Black Sabbath e Rolling Stones, a santeria Black Magic Woman de Carlos Santana e a psicodelia de Jimi Hendrix. O jazz está em tudo. Até no ritmo alucinado da escrita de Kerouac.

O jazz é a mistura, o orgulho, a modernidade, a sofisticação. Mais que música, é um mood, um estado de espírito, um way of life, viver na brisa, no improviso, aquela intersecção que nos encanta a todos, inclusive muito inspira a Strip Me, o jazz é a esquina mais cool entre a diversão e a arte.

Vai fundo!

Para ouvir: Elencar as canções mais importantes do jazz é trabalho hercúleo, é muita coisa! Mas a gente se esforçou pra te trazer um top 10 tracks jazz standards.

Para assistir: Um dos caras que melhor representam a música negra e, em especial o jazz, é Quincy Jones. Além de músico fantástico, Quincy também se enveredou na produção musical e trabalhou com grandes gênios, de Ray Charles a Michael Jackson. O documentário Quincy, lançado em 2018, dirigido pela dupla Alan Hicks e Rashida Jones e produzido pela Netflix é maravilhoso e mostra boa parte da história do jazz e da música opo.

Para ler: Louis Armstrong é considerada unanimemente como a personificação do jazz. Não à toa. Sua trajetória se confunde com a do gênero musical e isso é contada deliciosamente no excelente livro Pops, A Vida de Louis Armstrong, escrito pelo Terry Teachout e lançado em 2010 pela editora Lafonte. Leitura mega recomendada!

10 Anos sem Amy

10 Anos sem Amy

Originalidade e criatividade nunca forma o forte da Inglaterra, já reparou? Pensa bem, desde a idade média a gente vê despontando grandes gênios da pintura, da música, da literatura a maioria deles italianos, alemães, espanhóis… mas ingleses quase não se vê. É um país tão sem originalidade que o prato mais tradicional da culinária deles é peixe frito com batata frita. Entretanto, há e ser dito: o que eles não tem de originalidade, tem de sobra o poder de rápida assimilação e desenvolvimento. Não foram eles que inventaram o tear, mas foram eles que o desenvolveram para produção em larga escala e iniciando a Revolução Industrial. Não foram eles que inventaram o rock n’ roll, mas foram eles que o elevaram ao patamar de arte com Beatles, The Who, Bowie, Led Zeppelin

Photo by: Phill Griffin

Claro, existem exceções. A música negra, de maneira geral, os ingleses absorveram rapidamente, mas não foram capazes de superar os criadores do soul, do jazz e  do reggae. Bob Marley, Isley Brothers, Jimmy Cliff, James Brown, Aretha Franklin, Coltrane, Nat King Cole, Ella Fitzgerald, Billie Holiday, são todos artistas respeitadíssimos na ilha da rainha, influenciaram muita gente, mas ninguém chegou perto deles em genialidade e qualidade artística. Pelo menos assim foi até 2003.

Photo by: Jake Cheesun

Em outubro de 2003 foi lançado o disco Frank, álbum de estréia de Amy Winehouse, até então uma cantora desconhecida que se apresentava em pubs de Londres e impressionava todo mundo com sua voz incrível, presença de palco gigantesca e ótimas melodias que ela mesma compunha. Além disso, Amy revitalizava o jazz e os standards norte americanos. Era um Cole Porter de saias, em pleno século XXI respeitando o passado, mas flertando com o moderno R&B e novas tendências musicais. Era uma artista brilhante a ponto de explodir. E ela explodiria em muitos sentidos.

Photo by: Phil Knott

Amy Jade Winehouse nasceu em Londres no dia 14 de setembro de 1983. Ela vinha de uma família simples muito ligada à música. Sua avó paterna fora cantora de jazz e o pai era músico amador e tinha em casa uma vasta coleção de discos. Como vemos em muitas histórias de artistas geniais, a música sempre foi uma âncora para Amy, que teve desde cedo uma vida complicada. Seus pais se separaram quando ela tinha 6 anos de idade, fato que a desestabilizou muito. Adolescente, por volta de 14 anos, precisou tomar remédios controlados para ansiedade e, em seguida, já aprendeu os prazeres e excessos da vida boêmia, álcool, drogas… se distanciou da escola e se aproximou ainda mais da música.

Photo by: Phil Griffin

Em 2001 Amy já tinha gravado uma demo que rodava entre os executivos de pequenos selos de Londres. Quem resolveu apostar na cantora foi a Island Records. Foi onde Amy conheceu o produtor Salaam Remi, que se tornaria seu parceiro de composições, amigo confidente e o responsável por lapidar o talento dela. Entre meados de 2002 e 2003 o disco Frank foi concebido e gravado. O disco não alcançou vendas muito altas, mas foi muito elogiado pela crítica e levou Amy Winehouse a um patamar acima das apresentações improvisadas em pubs. Ela entrou para um circuito alternativo de shows que trouxeram mais maturidade musicalmente, além de abrir muitas portas. Junto com o ritmo frenético de shows, após um ano do lançamento de Frank, Amy começou a ser cobrada por um novo disco. O que acabou a levando a um terrível bloqueio criativo. Seu primeiro disco era formado por canções muito pessoais baseadas nas desventuras conjugais de seus pais e de um relacionamento fracassado vivido por ela. Agora sua vida se limitava a tocar, fazer shows e cair na farra. Ela não tinha de onde tirar inspiração para compor. Até que em 2005, num pub no bairro de Camden, ela conhece Blake Fielder-Civil.

Foi paixão à primeira vista. Com Blake Amy começou uma relação tumultuada e muito intensa. Apesar de muitas brigas e desconfianças que ele tivesse outras mulheres, eram um casal muito ligado. Também foi com Blake que Amy conheceu realmente o lado negro da força e experimentou pela primeira vez heroína e crack. Aí você pensa: “Daí em diante foi só ladeira abaixo.”. Engano seu! Porque quando ela se afundou no vício, tentaram várias vezes interna-la em clínicas de reabilitação, as famosas rehabs. Ela já estava relutante, mas depois que seu pai disse a ela uma vez que ela não precisava se internar e podia tentar ficar limpa por conta própria, ela disse” Vocês querem que eu vá pra rehab, mas não não não.”. Sem falar que o tempestuoso relacionamento com Blake reacendeu a chama musical e Amy compôs várias canções. Morria assim o bloqueio criativo e nascia assim um clássico.

No fim de 2006 Back to Black é lançado e o single Rehab se torna um hit avassalador mundo afora. Daí em diante, parece que o mundo em volta de Amy acelerou rumo ao inevitável. Tudo explodiu. O consumo cada vez maior de álcool e drogas faziam com que ela aparecesse em shows sem a menor condição de cantar, a fama lhe tirou a privacidade e ela era constantemente vista pelas ruas de Londres em frangalhos… tudo foi ficando insuportável. Em agosto de 2007 ela teve uma overdose e foi hospitalizada, em seguida, Blake Fielder-Civil foi preso após uma batida em sua casa onde foram encontradas quantidades consideráveis de várias drogas. A prisão de Blake só piorou as coisas para Amy. O tempo passava voando e ela foi perdendo shows, sem a menor condição de compor novas canções… e sua saúde se deteriorando a passos largos. Desde adolescente, Amy era bulímica, uma prática muito perigosa. O desequilíbrio agressivo da bulimia combinado ao excesso de álcool e drogas desgastou muito o organismo da cantora. Num piscar de olhos, cinco anos se passaram entre o lançamento de Back To Black e o dia 23 de julho e 2011.

Photo by: Terry Richardson

Na manhã daquele dia 23 de julho de 2011, Amy Winehouse foi encontrada morta em sua casa, em Londres. Exames detectaram uma quantidade assustadora de álcool no sangue dela. Ela vinha tentado parar de usar drogas na época, mas continuava bebendo muito. Frágil por conta da bulimia, é possível que o excesso de álcool em seu organismo tenha feito seu coração parar de bater. Amy morreu dois meses antes de completar 28 anos de idade. Sendo assim, sua morte reacendeu aquela famosa conversa da maldição dos 27 anos, idade em que, coincidentemente, alguns dos mais importantes músicos do rock morreram, como Jimi Hendrix e Kurt Cobain.

Photo by: Terry Oneill

Assim a boa e velha Inglaterra chegou ao século XXI confirmando sua expertise em gerar artistas que conseguem assimilar e ir além do que é feito fora da ilha. Amy Winehouse sintetizou o jazz, o R&B e a soul music numa linguagem nova e atraente; no melhor estilo antropofágico em que a Strip Me tanto se inspira, Amy Winehouse é uma das artistas mais geniais dos últimos 20 anos. Não poderíamos de jeito nenhum deixar os 10 anos de sua morte passar em branco. Preferimos sempre Back to Black.

Vai fundo!

Para ouvir: Todo mundo sabe que músicas como Rehab e Back to Black são maravilhosas. Por isso a gente elaborou uma playlist pra você ouvir um pouco mais do trampo da Amy Winehouse, além das músicas mais conhecidas. Top 10 tracks 10 anos sem Amy.

Para assistir: O documentário super intimista e bem elaborado, lançado em 2015 e dirigido por Asif Kapadia, intitulado, Amy, é simplesmente indispensável para quem quer conhecer  e entender a carreira meteórica de Amy Winehouse. E pra facilitar a sua vida, esse doc está completinho e legendado no Youtube. É só clicar aqui.

A Viagem da Psicodelia

A Viagem da Psicodelia

Liberdade, expansão mental, aglutinações sensoriais, as portas de Willian Blake e Aldous Huxley totalmente escancaradas para o livre acesso. Essa é a definição mais completa de psicodelia. Mas se você procura uma parada mais racional, podemos dizer que o termo foi usado pela primeira vez em 1957, numa reunião da Academia de Ciência de New York pelo psiquiatra britânico Humphry Osmond. A origem etimológica é a junção de duas palavras gregas, psique (ψυχή – alma) e delein (δηλειν – manifestação). Ou seja, psicodelia é a manifestação da mente, um estado de estímulo sensorial e psíquico exacerbado. Além de um estado mental, a psicodelia também é o nome dado a todo um movimento artístico multimídia que coloriu o mundo à partir de 1967.

Aquele miolinho da década de 60 chega a ser difícil de explicar, porque foi uma sucessão absurda de fatos que acabariam por formatar o movimento hippie e a psicodelia. A geração de jovens daquela década eram os filhos do pós Segunda Guerra Mundial. Com o fim da Guerra, os Estados Unidos tomaram a dianteira da economia mundial e estabeleceram o american way of life e o consumismo em sua sociedade. A Guerra Fria decolava e o combate aos comunistas gerou, entre outras coisas ruins, a Guerra do Vietnã. Em 1967 o conflito no Vietnã já se mostrava totalmente descabido, jovem nenhum queria largar tudo para morrer entupido de napalm em selvas asiáticas. Estes mesmos jovens estavam crescendo sob a sombra da geração anterior que começou a questionar tudo isso. Era a Geração Beat, que falava de auto conhecimento, desprezo ao consumismo e a entrega à vida de excessos. Em paralelo a música avançava, o rock n’ roll deixava de ser uma música inocente para se tornar uma voz empolgante de protesto. Para completar, as artes plásticas viviam um momento de total transformação com a Pop Art, que se apresentava como uma evolução do surrealismo. O doce, quer dizer, a cereja no bolo, era o LSD, que teve no camarada Timothy Leary seu maior entusiasta.

A psicodelia enquanto movimento artístico estético teve uma plenitude relativamente curta e poucos representantes. Artistas como Rick Griffin e Wes Wilson já transitavam pela Pop Art, o Surrealismo e a Art Nouveu. Acabaram ficando conhecidos por conceber cartazes de shows e festivais, bem como capas de discos, que é onde a psicodelia é graficamente reconhecida em sua totalidade. Em telas, murais e obras mais imponentes, dessas que vão para as paredes dos museus, ela acaba sendo um sub-gênero, que aparece como um elemento. Por exemplo, a famosa Marilyn Monroe, do Andy Warhol, é uma obra Pop Art que carrega influências psicodélicas óbvias através de suas cores fortes. Esteticamente a psicodelia reinou soberana nos cartazes e capas de discos de 1967 até o comecinho da década de 1970. Depois disso, foi se diluindo entre os novos conceitos de estética que pintaram mundo afora.

A real é que a psicodelia é uma parada etérea, é uma mistura de sentidos mesmo. Não dá pra limitá-la a um conceito estético, musical ou filosófico, porque é isso tudo junto, cada elemento se alimentando um do outro. A filosofia alimenta a música, que alimenta a estética, as cores… é um todo. É o rock n’ roll, é a alegoria do paz e amor, é a liberdade sexual, é a expansão da mente através de alucinógenos que aguçam as percepções e sentidos, é uma metamorfose ambulante que nos deu Jimi Hendrix e Robert Crumb, só pra ficar em dois exemplos distintos e fundamentais.

A mistura de cores, música, arte, positividade e consciência de união e liberdade atravessou as décadas e hoje inspira toda uma coleção linda e super alto astral de camisetas Strip Me. Afinal, não dá pra parar no tempo, né? Ontem era The Byrds, hoje é Tame Impala, a psicodelia se renova e traz toda essa aura viajandona paz e amor em estampas alucinadas! Vem ver!

Vai fundo!

Para ouvir: Uma playlist com o ontem e o hoje da música psicodélica pra ouvir até chapar! Top 10 tracks psicodélicas!

Para assistir: Neste texto, não falamos sobre o Brasil, que também viveu intensamente a psicodelia com um jeitinho só nosso, o Tropicalismo. Para conferir esse astral brazuca da psicodelia, vale assistir o documentário O Barato de Iacanga, dirigido pelo Thiago Mattar, lançado em 2019 e disponível na Netflix.

Para ler: Existem vários bons livros sobre a vida e obra de Jimi Hendrix. O jornalista francês Franck Medioni escreveu um desses livros, uma biografia bem completa e que contextualiza muito bem a época em que Jimi Hendrix viveu seu auge como artista. O livro chamado simplesmente Jimi Hendrix – Biografia saiu pela editora L&PM e é super fácil de achar, além de ser baratinho. Leitura recomendada.

Delícias da Transformação

Delícias da Transformação

Os primeiros europeus que chegaram no Brasil á partir de 1500 deram de cara com povos esquisitíssimos. Além da língua incompreensível que falavam, tinham hábitos muito incomuns. Andavam nus, depilavam o corpo, tomavam banho diariamente, alguns eram muito agressivos, eram afeitos à guerra e, quando guerreavam, capturavam seus inimigos mais fortes e os comiam em rituais místicos. Em resumo, era um povo muito limpinho, mas canibal. Mas o ato de comer carne humana não era pelo simples alimento. Eles acreditavam que comendo seus inimigos, os índios incorporavam suas qualidades, como bravura, força e inteligência. Era o que acabou ficando conhecido como banquetes antropofágicos.

Vários europeus  do século XVI presenciaram e registraram tais banquetes em seus diários. O relato mais famoso foi o do alemão Hans Staden, que esteve no litoral do atual estado de São Paulo, mais especificamente em Ubatuba, em 1554 e foi capturado pelo índios Tamoio. A história desse cara é inacreditável, era pra ele ter sido comido, mas por uma porção de acasos, incluindo ele se passar por francês, ele ficou como prisioneiro por mais de um ano na tribo e acabou sendo libertado. Mas durante a sua estadia presenciou alguns desses rituais antropofágicos. Em 1557 Staden volta para a Europa, onde escreve um livro contando o que viveu no Novo Mundo, livro este que se torna um sucesso.

Ao raiar do século XX, mais de 350 anos depois de Hans Staden voltar pra casa e colocar no papel sua história, um intelectual chamado Eduardo Prado redescobre o livro de Staden e o publica no Brasil. Oswald e Mario de Andrade, Tarsila do Amaral e toda a turminha modernista da Semana de Arte de 1922 lê este livro e faz a conexão com o primitivismo e a busca de uma identidade que eles tanto queriam. Assim como os índios deglutiam seus inimigos ritualisticamente para absorver sua força, bravura, e inteligência, os modernistas entenderam que não precisavam renegar a arte que vinha da Europa, mas sim absorvê-la e transformá-la em algo novo e genuinamente brasileiro. Surge assim o Manifesto Antropofágico.

Assim como a história, a arte não é estática e imutável. Ela é volátil, deliciosamente mutante e adaptável aos novos tempos, aos novos conceitos. A arte não tem dono porque ela é única pra cada um, seja para quem a produz, como para quem a consome. É nessa aura livre, de absorção e transformação que a Strip Me está sempre se reinventando e apresentando novas coleções e novas estampas. É o caso da nova coleção com capas de discos clássicos em versão minimalista. Discos que, além de clássicos incontestáveis, verdadeiramente nos encantam e influenciam, e aparecem nesta coleção com a cara da Strip Me, numa estética moderna e descolada.

Além do mais são discos que tem tudo a ver com as transformações e antropofagias da arte. Afinal, uma das maneiras mais objetivas de descrever o primeiro disco dos Strokes, o brilhante Is Thsi It?, é dizer que se trata de uma banda que deglutiu avidamente Velvet Underground e Rolling Stones, para em seguida conceber uma música visceral e muito original, mas que não nega suas origens. Não é à toa que, quando este disco foi lançado, em 2001, muita gente alardeou se tratar do novo Nirvana.

Sim, porque a banda de Kurt Cobain havia sido catapultada para o sucesso dez anos antes com o disco Nevermind seguindo a cartilha da busca pela originalidade absorvendo tudo de bom que veio antes deles. Nirvana reinventou o punk rock, conseguiu impor no mercado moralista e irreal da música pop uma mistura inigualável de agressividade e lirismo com bases fincadas no mundo real, na apatia e inconformismo juvenil, além, é claro, de referências sensacionais da música. Iggy Pop & The Stooges, Bob Dylan.. ah, sim, e também David Bowie!

Mas é claro! Não dá pra não falar do camaleão do rock, a personificação da antropofagia musical, the one and only David Bowie! O cara ajudou a moldar toda a estética dos anos 70, transcendendo a música tanto quanto a capa o disco Alladin Sane, de 1973, que se tornou icônica. Neste disco, além de todas as suas influências pregressas, este disco é altamente antropofágico, pois Ziggy Stardust é morto e devorado, para que Bowie renasça como Alladin Sane. Com certeza um dos discos mais irrepreensíveis de Bowie. Um disco com grandes canções e uma capa tão marcante quanto aquela daqueles caras atravessando uma rua.

Se o Bowie é a personificação a antropofagia musical, os Beatles com certeza são a alma. É indiscutível que a transformação mais incrível que a música pop já viveu se deu por culpa desses 4 caras e Liverpool. É só pegar os principais discos de 1960 pra trás. Era tudo meio parecido. Rocks ótimos e muito divertidos, claro, de Chuck Berry e Little Richards, baladas lindas de Buddy Holly e Fats Domino, standards do jazz e uma florescente soul music que despontava com Isley Brothers e The Ronnetes. Os Beatles pegaram isso tudo, engoliram, digeriram e criaram um tempero muito próprio para uma nova música pop. Não só criaram, como desenvolveram! Chegaram a um ápice criativo altamente condimentado com o Sgt. Pepper’s… e alcançaram o equilíbrio e maturidade em seu último e genial suspiro fonográfico: Abbey Road.

Olha, essa coleção está incrível  e é altamente recomendável que você dê uma boa conferida. Aliás, é preciso estar atento e forte na nossa loja sempre! Afinal, estamos em constante transmutação, com novas ideias, estampas, coleções, diversão & arte.

Vai fundo!

Para ouvir: Uma playlist com o creme de la creme dos 4 discos que estampam essa nova coleção. Top 10 tracks Minimal Classic Albums.

Para ler: Chega a ser indispensável a leitura de Duas Viagens ao Brasil, o livro de Hans Staden escrito em 1557. Uma história épica, inacreditável e empolgante, que retrata a história deste alemão aventureiro e, em paralelo, do Brasil recém descoberto.

Brasil em foco.

Brasil em foco.

Quando você quer conhecer ou se aprofundar em alguma atividade, seja tocar um instrumento, desenhar, fotografar, praticar um esporte… a tendência é procurar os nomes mais importantes e influentes do ramo pra se inspirar e usar como referência, né? Usando o célebre pensamento de John Lennon, de pensar globalmente e agir localmente, é normal que a gente pense nos maiores nomes do mundo. O próprio Lennon, ou, sei lá, Jimi Hendrix na música, Michelangelo ou Van Gogh nas artes e por aí vai. Acontece que em todas as áreas artísticas temos grandes exemplos aqui mesmo, no Brasil. Em especial na fotografia, alguns são reconhecidos no mundo todo como grandes mestres. É o caso de Sebastião Salgado, German Lorca, Bob Wlfenson, entre outros.

A fotografia é uma parada muito interessante porque parte de uma técnica básica bem específica e científica, exposição à luz e controle de lentes para foco e profundidade. Entretanto, é uma expressão artística que permite que cada artista imprima sua marca, sua personalidade. Mais impressionante é notar que isso também ocorre no show business. Fotógrafos especializados em retratar artistas, concertos e moda  também se destacam,ainda que pareça (ou que efetivamente) façam fotos comerciais, dá pra notar a personalidade, sensibilidade e força individual no trabalho de cada um. Por isso hoje, vamos elencar aqui os 5 profissionais da fotografia mais emblemáticos e conhecidos que atuaram, e ainda atuam, no cenário pop brasileiro.

Rui Mendes

Talvez o mais conhecido fotógrafo da cena musical no país, Rui Mendes se formou em fotografia na Fort Vancouver Junior College, nos Estados Unidos, no final dos anos 1970. Voltou ao Brasil em seguida e começou a trabalhar na Folha de S. Paulo. Amante da música, se ligou rapidamente aos músicos de São Paulo e passou a fotografá-los. À medida que ia conhecendo mais gente, aumentava seu leque de artistas em seu portfólio e começou a fotografar inclusive para capas de discos. RPM, Lulu Santos, Camisa de Vênus, Legião Urbana, Barão Vermelho, Ira!, Titãs, Capital Inicial, Kiko Zambianchi, Inocentes, Ultraje a Rigor, Ratos de Porão, Sepultura, Skank são só alguns dos artistas que já olharam para a lente de Rui Mendes. Além disso seu trampo como fotojornalista também impressiona, em revistas como Vogue, Trip, Época, TPM, Galileu, entre outras.

Seu Jorge por Rui Mendes

Caroline Bittencourt

Morando e atuando hoje em Copenhagen, Dinamarca, Caroline é uma fotógrafa jovem, brasileira, que se destacou fotografando shows entre Rio e São Paulo nos anos 2000. Seguindo a regra, ela sempre nutriu muito amor e interesse pela música brasileira, o que facilitou para que ela pudesse circular com desenvoltura no cenário musical. Ela já retratou algumas capas de discos, mas sua fotografia impressiona mesma quando retrata shows. Ela tem uma sinergia com o artista em ação no palco, e soma-se a isso seu apreço pela técnica e o uso de equipamento essencialmente analógico. Estão em seu portfólio nomes como Adriana Calcanhoto, Orquestra Imperial, Cidadão Instigado, Criolo e Los Hermanos.

Adiana Calcanhoto por Caroline Bittencourt

Marcos Hermes

Carioca, Marcos Hermes começou a fotografar ainda jovem no começo dos anos 1990. Logo se destacou com seus trabalhos para revistas como a Bizz, Claudia, Veja e Quatro Rodas. Se especializou em fotografar concertos e shows, e conseguiu ir muito longe com as suas fotos. Além de já ter fotografado nomes consagrados do Brasil como Caetano Veloso, Maria Bethânia, Ney Matogrosso e Elza Soares, Marcos Hermes também já trabalhou com o supra sumo da música pop, fotografando oficialmente Rolling Stones, Paul McCartney, Elton John, Beyoncé, Amy Winehouse, Steve Wonder, entre outros.

Caetano Veloso por Marcos Hermes

Daryan Dornelles

Um gênio da fotografia brasileira, Dornelles é um dos fotógrafos com mais personalidade  dos últimos tempos. Seja para capas de discos, fotos de divulgação ou registrando shows, ele consegue uma sintonia fina entre a obra do fotografado e a imagem que será reproduzida, resultado de muita intimidade com a música. Dornelles já declarou que quando vai fotografar determinado artista, ouve sua obra exaustivamente para alcançar essa conexão. São dele algumas das imagens mais marcantes de artistas como Chico Buarque, Martinho da Vila, Criolo, Marisa Monte e Tiê.

Emicida por Daryan Dornelles

J.R. Duran

José Ruaix Duran nasceu em Barcelona, na Espanha, mas foi no Brasil que ele se consagrou um dos mais requisitados fotógrafos do mundo, e onde morou por um longo período entre sua carreira de mais de 50 anos. Então dá pra dizer que ele é brasileiro sem medo de errar. Ele talvez seja o fotógrafo do show business mais conhecido do país. Com seu estilo forte, nítido, charmoso e elegante, J.R. Duran fotografou algumas das capas mais importantes da revista Playboy do Brasil, além de consagrado na moda e publicidade. Pra se ter ideia, ele já ganhou dez Prêmios Abril de Fotojornalismo, passando a ser horsconcours desse prêmio.

MC Guimê por J.R. Duran

A fotografia junta tanta coisa boa de forma artística, representando a música e a moda com beleza e intensidade, que tem tudo a ver com a Strip Me. Também somos apaixonados por fotografia, por isso acabamos de lançar uma coleção especial com este tema! Vem conferir!

Vai fundo!

Para ouvir: Uma playlists com alguns dos artistas que foram retratados pelos fotógrafos citados neste post. Top 10 tracks Foto BR!

Orgulho, diversão & arte.

Orgulho, diversão & arte.

Hoje fechamos a trilogia de posts dedicados ao mês do orgulho LGBTI+. Já demos uma geral na história, já falamos sobre os direitos na teoria e na prática, tudo direitinho. Mas convenhamos que a gente não é de ferro e também precisa relaxar e curtir a vida, não é mesmo? Por isso, vamos fechar essa trilogia com o astral lá em cima falando do que a gente mais gosta: arte! Afinal, a arte está recheada de grandes obras e grandes personalidades que representam muito bem os homossexuais de todo o mundo. Vamos falar sobre alguns deles.

É muito legal notar que existem filmes, peças de teatro, canções e pinturas que retratam ou são inspiradas em temáticas gays, mas que são concebidas por artistas héteros. Da mesma maneira, tem muito artista homossexual que não necessariamente explora este tema em suas obras. Um grande exemplo disso é o gênio da Pop Art, Andy Warhol. Notoriamente homossexual, afeito a festas e bares que celebravam a diversidade, por onde transitavam artistas de vanguarda, transexuais e todo o tipo de pessoas que não se encaixavam nos padrões “normais” da sociedade dos anos 1960 e 1970, Warhol conseguiu ser visto e celebrado em todo o mundo como um artista genial, sem precisar esconder seu estilo de vida. Produziu obras de arte incomparáveis sem esbarrar em nenhum momento na militância. Ter o orgulho de não esconder sua vida pessoal, por mais excêntrica que fosse, mostrando que isso não interferia negativamente na sua competência como profissional já foi militância suficiente.

Na música não são poucos os exemplos de artistas gays que tem uma obra invejável sem colocar em evidência sua sexualidade. Rob Halford é um dos vocalistas de heavy metal mais influentes do estilo e fez história frente à banda Judas Priest. Ele se assumiu homossexual em 1998 numa entrevista para a MTV e chocou muita gente. O rock, e em especial o metal, é um meio muito machista e homofóbico. O fato de Halford ter se assumido publicamente ajudou muito a abrir o diálogo e quebrar esses preconceitos. Aqui no Brasil um dos músicos mais influentes da música pop também se assumiu tardiamente, porém sem causar tanta surpresa quanto o vocalista do Judas Priest. Lulu Santos é um dos músicos mais respeitados do rock e pop desde os anos 1980. Exímio guitarrista e compositor de muito bom gosto, Lulu Santos sempre foi discreto com sua via pessoal, e na música nunca foi panfletário, apesar de falar frequentemente sobre amor livre e diversidade. Ele assumiu ser gay somente em 2018 e todo mundo ficou feliz por ele, porém, surpreso mesmo, ninguém ficou.  Mas tudo bem.

Deixando um pouco de lado os artistas e falando sobre obras de arte, não há mídia melhor para representar um grupo de pessoas tão plurais, cheias de vida, de amor, de cores e de histórias fantásticas como o cinema. É onde as imagens, a música e a história se juntam para proporcionar uma experiência de vida capaz de nos encantar, inspirar, divertir e fazer pensar. Então fizemos um top 5 filmes sensacionais que representam muito bem a comunidade gay e, cada um à sua maneira, proporciona reflexões importantíssimas.

5 – Meninos Não Choram

É um filme pesado, é verdade. Mas é uma história incrível e muito bem retratada no filme. História real, aliás. Brandon era um rapaz que nasceu mulher, mas desde criança se identificava como homem e tentou se impor como tal. É uma história trágica sobre aceitação e preconceito. Um filme de roer as unhas, emocionante, e com atuações inacreditáveis. Tanto que Hilary Swank ganhou Oscar de melhor atriz em 2000 pela sua atuação como protagonista. Boys Don’t Cry foi lançado em 1999, escrito e dirigido por Kimberly Peirce e tem uma baita trilha sonora boa!

4 – Madame Satã

O representante brasileiro nesta lista é um ótimo filme, também baseado em uma história real e com atuações excelentes. Madame Satã era o “nome de guerra” de João Francisco dos Santos. Ele foi um dos primeiros transformistas do  Brasil e virou ícone da liberdade sexual no país, com uma trajetória surpreendente no Rio de Janeiro dos anos 1930. O filme foi lançado em 2002, dirigido por Karim Aïnouz e protagonizado com brilhantismo por Lázaro Ramos.

3 – Filadélfia

Um clássico, né? Este filme está aqui porque representa muito bem o preconceito que os gays sofriam nos anos 1980 e 1990, agravado pelo surgimento da AIDS. Mas além de retratar super bem este momento, é um filmaço em todos os aspectos. Uma trilha sonora arrebatadora com Bruce Springsteen, Neil Young, Sade, Maria Callas, Peter  Gabriel, atuações impressionantes de Tom Hanks e Denzel Washington e direção irretocável do gênio Jonathan Demme. O filme foi lançado em 1993 e ganhou dois Oscars no ano seguinte: Melhor Ator e Melhor Canção Original.

2 – Tudo Sobre Minha Mãe

Que o Almodóvar é um gênio, não há dúvida, né? Porém, na hora de escolher qual o seu melhor filme, aí dúvida é o que não falta, tantos são os filmes excelentes dele. Mas com certeza um que sempre vai estar entre seus 3 melhores trabalhos é este. Uma história comovente e arrebatadora, colocada impecavelmente num roteiro que consegue ser dramático e bem humorado, bem amarrado e instigante. A trama se desenrola quando uma mãe solteira tem seu filho envolvido em um acidente e vai à procura do pai da criança, que virou travesti. Uma história insólita e cheia de surpresas que acaba por tratar diversos temas espinhosos com muita propriedade. O filme escrito e dirigido por Almodóvar foi lançado em 1999 e levou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

1 – Priscilla – A Rainha do Deserto

É uma escolha óbvia? Um baita clichê? É sim! Mas nenhum filme na história conseguiu com tanta perfeição representar o espirito gay com tanto brilhantismo. Está tudo lá. A alegria, o glamour, a paixão pela arte, os preconceitos, é claro, e todas as dificuldades e delícias de se assumir como é e viver assim. Priscilla – A Rainha do Deserto é um road movie delicioso, engraçado e empolgante, desses filmes que a gente já viu um monte de vezes, mas sempre acaba vendo de novo. O filme foi lançado em 1994, escrito e dirigido por Stephan Elliott e se tornou, logo de cara, um clássico absoluto. Ah, sim, e também tem uma trilha sonora daquelas!

E assim finalizamos nossa trilogia de posts especiais no mês do orgulho LGBTI+. Posts que, além de homenagear e celebrar a diversidade, reforçam o posicionamento da Strip Me como uma marca que abraça a diversidade e faz coro com todas as vozes que clamam por liberdade e igualdade. Afinal tudo que é escrito aqui representa os princípios e valores da marca. Orgulho, diversão e arte em junho, no ano todo e por toda a vida!

Vai fundo!

Para ouvir: A playlist hoje dá uma geral nas trilhas sonoras dos cinco filmes indicados neste post! Confere lá! Top 10 tracks LGBTI+ Soundtracks!

Woodstock Sem Limites

Woodstock Sem Limites

Foi o ápice. Foi o início do fim. Foi o prenúncio de uma nova era. Foi uma enganação. Foi um ato revolucionário. Foi o maior evento da história moderna. Foi uma loucura. Woodstock foi tudo isso, e, provavelmente, muito mais. O festival de música, paz e amor que encerrou a década de 1960 ainda hoje é lembrado, comentado, celebrado e questionado. É compreensível que seja assim, afinal todas as dimensões ali foram transpostas. O tamanho, o número de pessoas reunidas, o line up estrelado, a liberdade, o congestionamento de estradas, nudez, consumo de drogas, intervenções climáticas, solidariedade, dinheiro gasto e arrecadado, processos judiciais, dívidas e, por fim, sucesso. Tudo isso esteve presente em larga escala em Woodstock.

Reprodução do cartaz oficial do festival

Michael Lang e Artie Kornfeld eram amigos, músicos ligados ao movimento hippie e estavam, no comecinho de 1969, com a ideia de montar um estúdio para gravar novas bandas e um selo para lançar seus discos, já que Kornfeld era funcionário da Capitol Records e tinha know-how e muitos contatos. Mas faltava o famoso capital inicial, já que eles eram os típicos músicos quebrados. Foi quando viram no jornal um anúncio de uma dupla de empresários que procurava projetos audaciosos ligados a arte e música para investir. Assim, Kornfeld e Lang se juntaram a John Roberts e Joel Rosenman. A dupla de empresários topou a empreitada, e o agora quarteto começava a planejar seu projeto de estúdio, batizado de Woodstock, que é onde eles queriam se estabelecer. Isso porque a pequena cidade de Woodstock, próxima a New York, era onde Bob Dylan morava na época. Lang e Kornfeld eram muito fãs de Dylan e sonhavam com a ideia de que Dylan passasse a gravar em seu estúdio, o único na cidade onde ele morava. Mas o investimento para montar um bom estúdio era alto demais até mesmo para os jovens ricos empresários Roberts e Rosenman. Então surgiu a ideia de fazer um festival de música para alavancar o projeto com a grana da venda de ingressos. Então Woodstock começou a ser pensado como um festival de música.

Woodstock era uma cidade pequena e cercada de fazendas e ranchos. Com uma população essencialmente de meia idade e conservadora. Quando se espalhou a notícia que quatro jovens queria reunir um bando de hippies nas suas terras, rolou uma comoção popular e eles não conseguiam autorização para fazer o festival em lugar nenhum. Até que um senhor com uma grande fazenda de vacas leiteiras na cidade de Bethel, vizinha a Woodstock, topou alugar suas terras e abrigar essa maluquice toda. Vale dizer que isso só aconteceu duas semanas antes da data já marcada para o festival acontecer. Então vamos colocar na linha do tempo. A ideia do festival pintou em janeiro de 1969 e o evento estava marcado para acontecer no fim de semana dos dias 15, 16 e 17 de agosto do mesmo ano. No fim de julho eles ainda não tinham o lugar definido. Mas já tinham vários nomes grandes confirmados.

O público de Woodstock. Photo by Dan Garson

Mas não foi nada fácil conseguir um line up tão poderoso. E o mérito deve ser dado à banda Creedence Clearwater Revival. Antes do Creedence assinar, eles não conseguiam fechar com ninguém, pois não eram conhecidos, queriam fazer um festival no meio do nada… ninguém botava fé. Mas depois que o Creedence, que na época era um dos maiores nomes do rock norte americano, comprou a briga e assinou, todo mundo foi atrás. E aqui estamos falando de boa parte dos grandes ícones da música na época: Janis Joplin, Grateful Dead, The Who, Jimi Hendrix, Sly & the Family Stone, Santana, Crosby, Stills, Nash & Young, Mountain, Jefferson Airplane, The Band, Joe Cocker, Tem Years After, Ritchie Havens, Joan Baez… e quem ficou de fora por, ainda assim não botar fé no evento, no futuro se arrependeu. Foi o caso de bandas como The Doors e Led Zeppelin. E olha que ninguém ali estava fazendo caridade. Todo mundo tinha contrato e cachê estabelecido. O papo hippie de não ligar pra dinheiro e bens materiais passou longe de Woodstock. Costuma-se dizer, aliás, que o festival foi de graça, mas não foi bem assim.

A banda Creedence Clearwater Revival durante o show em Woodstock. Photo by Elliot Landy
The Who durante o show em Woodstock. Photo by Henry Diltz

Os ingressos para o festival custavam 18 dólares antecipados e custariam 24 dólares na hora. Custariam. O festival estava previsto para receber 50 mil pessoas no máximo. Acontece que só de ingressos antecipados foram vendidos quase 100 mil. Dois dias antes do início do festival as estradas que levavam a Bethel já estavam tomadas por hippies de todo o canto. A organização do festival não teve tempo de montar as bilheterias na entrada. No primeiro dia do evento, eles desistiram de tentar controlar a entrada de pessoas e liberaram a entrada de geral. 100 mil pessoas, aproximadamente, pagaram ingresso. Mas o festival reuniu mais de 400 mil pessoas! Pra você ter ideia, isso é mais gente do que a população de muita cidade Brasil afora. E teve muita gente que ficou pelo caminho. As estradas ficaram tão congestionadas, que muita gente abandonava seus carros e concluía o trajeto até o festival a pé. O que só piorou a situação, pois se acumulavam carros parados pelo trajeto que dificultavam o trânsito de outros veículos. Teve muita gente, inclusive, que tinha comprado ingresso, não conseguiu chegar por causa do trânsito e acabou processando a organização. E foram tantos processos que os caras conseguiram quitar todas as dívidas acumuladas por conta do festival só dez anos depois, em 1980.

A estrada para Woodstock. Photo by Baron Wolman
A estrada para Woodstock. Photo by Baron Wolman

Olha, Woodstock  é cercado por tantas histórias incríveis, algumas verdadeiras, outras lendas, que daria um texto imenso. Teve o Pete Townshend, do The Who, expulsando a golpes de guitarra um ativista que subiu no palco durante o show para protestar contra a prisão de John Sinclair, que era também ativista e empresário da banda MC5. Teve uma multidão passando mal por tomar LSD de má procedência, teve uma chuva torrencial que fez com que o pessoal do Grateful Dead tocasse levando choques terríveis de seus instrumentos e microfones. Ah, teve também uma comoção popular dos moradores das fazendas vizinhas, que souberam que as pequenas empresas que forneciam comida para o festival não estavam dando conta de alimentar todo mundo, e doaram comida. A região era grande produtora de granola, que foi doada em grande quantidade. À partir daí a granola se popularizou entre os hippies, virou sinônimo de alimento saudável e está aí até hoje. É sério isso! A granola é o que é hoje por causa do Woodstock, senão seria só mais um ingrediente misturado para fazer os cereais infantis matinais.

Woodstock. Photo by Elliot Landy

Em 2020 oficialmente atingimos a famosa (entre os astrólogos) Era de Aquário. Acontece que essa era já vinha sendo anunciada desde 1967 e foi um dos motes do Woodstock. Diz-se que a Era de Aquário vai trazer harmonia e mais conhecimento para a Terra (Será? Tomara, né, porque estamos precisando). Também foi o ápice da contra-cultura, do movimento Flower Power e das manifestações contra a guerra do Vietnã. Também foi o começo do fim da era de ouro do rock n’ roll. Dali em diante, o consumo de drogas, que até então era muito mais ligado ao auto conhecimento,  se tornou desenfreado, a cocaína entrou com tudo e deixou tudo mais caótico. Os conflitos tornaram-se mais violentos nos anos 70 e o rock n’ roll sofria uma queda de popularidade e perdia seu status de arte para se tornar apenas hedonismo descontrolado, ou uma forma pedante de música elaborada até demais (a.k.a. rock progressivo). O que só viria a mudar com os punks na segunda metade da década, que resgatariam a essência do rock.

O fato é que o Woodstock entrou para história como o maior festival de música de todos os tempos, um verdadeiro marco na cultura pop. Dá pra dividir a cultura do século XX entre antes e depois de Woodstock. Um festival que trazia a música, mas também toda a carga política, social e de consciência de toda uma geração.  Rock n’ roll, atitude, diversão, consciência, engajamento! Tudo que a Strip Me gosta e espalha por aí! Por isso a gente não poderia deixar de falar sobre esse evento maravilhoso por aqui. Assim, cá estamos. Missão cumprida.

Vai fundo.

Para ouvir: Aquela playlist difícil de ser elaborada com o que rolou de melhor no Woodstock de 1969. Então confira  nossa playlist Woodstock ‘69 Top 10 Tracks.

Para assistir: O Woodstock foi todo filmado e acabou virando um documentário um ano depois. Woodstock – 3 Dias de Paz, Amor e Música foi lançado em 1970. Dirigido por Michael Wadleigh, o filme levou o Oscar daquele ano de Melhor Documentário. Ah, e uma curiosidade: o assistente de direção e um dos editores deste filme foi um jovem aspirante a cineasta chamado Martin Scorcese.

Para ler: Um dos quatro responsáveis pelo festival, Michael Lang, escreveu o livro definitivo sobre Woodstock. O ótimo A Estrada Para Woodstock foi lançado em 2019 pela editora Belas Letras no ano em que o festival completou 50 anos. Uma leitura deliciosa, recheada de curiosidades e muitos causos.

40 Anos Sem o Rei do Reggae.

40 Anos Sem o Rei do Reggae.

O começo da história até que é comum aqui no Brasil. Um garoto negro, nascido na favela em meio a muita pobreza e apaixonado por futebol consegue vencer na vida e ser mundialmente reconhecido. Acontece que a história que vamos contar hoje não se passa no Brasil e, apesar de realmente apaixonado por futebol, esse garoto negro venceu na vida através da música e de um estilo de vida que, até então, o mundo desconhecia. Hoje vamos relembrar a história de um dos maiores ícones da cultura pop dos século XX: Bob Marley, que no dia 11 de maio deste ano completou 40 anos de sua morte.

Photo by Dennis Morris

A história do Bob Marley é muito interessante, cheia de passagens curiosas. Pra começar, ele cresceu em Trenchtown, a maior favela de Kingston, capital da Jamaica. Lá, com apenas 5 anos de idade o pequeno Marley levantava uma grana lendo a mão das pessoas na rua. Claro que devia ser uma baita enrolação, mas já demonstrava que era um garoto com muito carisma para lidar com as pessoas. Um tempo depois, a mãe de Bob, que já não estava mais com o pai dele, passou a viver com um homem que tinha um filho chamado Neville Livingston, que tinha a mesma idade e de cara ficou amigão do Bob. Os dois moleques não se largaram mais e passaram a dividir uma grande paixão: ouvir rádio e cantar suas músicas favoritas. Já na juventude, Neville adotaria o apelido pelo qual ficou conhecido mundo afora: Bunny Wailer.

Paint on canvas by Mick Rock – 2008

Adolescentes, Bob e Bunny viviam procurando diversão e conheceram um grupo vocal ali mesmo, em Trenchtown, e passaram a andar com aquela rapaziada. E acabaram se tornando muito amigos de um desses rapazes, um certo Peter Tosh. Pirando no dubstep, rocksteady e ritmos caribenhos como o calipso, que dominavam a Jamaica nos anos 1960, o trio montou a banda The Wailing Wailers, conseguiram gravar dois ou três compactos que tiveram uma aceitação local muito boa. Tanto é que os caras resolveram arriscar trocar de ilha, saindo da Jamaica e indo para a Inglaterra. Ali, ironicamente, iriam acabar entrando na gravadora Island Records. Mas não foi moleza.

Bunny Wailer, Bob Marley e Peter Tosh nos tempos de Wailing Wailers, 1964
(Photo by Michael Ochs)

Na Inglaterra, eles fizeram uma tour morna, que não rendeu muita grana. Na real, mal se pagou. Tanto é que a banda se viu ali sem sequer ter grana pra voltar para a Jamaica. Foi quando conheceram um produtor tido como malandro na cena musical londrina chamado Chris Blackwell. Blackwell era dono da Island Records e tinha revelado o primeiro grande nome do reggae, Jimmy Cliff. Acontece que Cliff tinha acabado de sair da Island para assinar com uma grande gravadora. Blackwell viu naqueles jamaicanos, principalmente no carismático Bob Marley, seu novo Jimmy Cliff. Ele ofereceu o seguinte acordo para os rapazes. Ele pagava a passagem de volta deles para a Jamaica. Mas em troca, antes de partir, eles gravariam um disco, que Blackwell lançaria pela Island. Foi assim que surgiu um dos maiores clássicos do reggae, o disco Catch a Fire.

Importante dizer que na época dos Wailing Wailers na Jamaica, a banda interpretava canções de amor sem muito conteúdo. Mas, pouco antes da viagem para a Inglaterra, ainda com uns 18, 19 anos de idade, Bob Marley se converteu ao Rastafari. Uma seita religiosa criada na própria Jamaica, com base nas raízes dos negros etíopes, e que tinham a maconha como erva sagrada. Após sua conversão, Bob Marley passou a escrever canções que professavam sua fé, cantando sobre os principais valores do Rastafari, a igualdade, pureza, e amor. Bob Marley, Bunny Wailer e Peter Tosh realmente abraçaram a causa rasta, inclusive se tornando veganos, não consumindo álcool e nem tabaco, bem como drogas sintéticas.  Desta forma, o disco Catch a Fire já veio envolto numa densa névoa de maconha, literalmente, e de canções incríveis! Nessa época, a banda já se apresentava com o nome mais enxuto: The Wailers. Eles cumpriram sua parte no acordo com Blackwell, gravaram o disco e voltaram pra casa. Na Inglaterra, Blackwell se ligou que tinha uma pérola nas mãos e lançou o disco com uma alteração muito marcante, sem consultar a banda. O disco saiu em 1973 sob o nome Bob Marley and The Wailers. E, tal qual a fumaça do cigarrinho de artista da banda, a canção Stir It Up foi pras cabeças e alavancou a venda do disco. Bob Marley and The Wailers começavam a ganhar fama internacional.

Photo by Dennis Morris

Impulsionados pelas boas vendas na Inglaterra, a banda foi tentar a sorte nos Estados Unidos. Lá caíram nas graças da turma da música negra que dominava o começo dos anos 1970 e acabaram sendo contratados como banda de abertura dos shows da Sly and the Family Stone. Acontece que a turnê não durou mais que dez shows. De cara, o show de Bob Marley and The Wailers passou a ofuscar a atração principal. Muita gente pirava no show de abertura e acabava não dando muita bola para a Sly and the Family Stone. Resultado, tour cancelada para os jamaicanos. Mas tudo bem. Eles fizeram alguns shows por conta própria e começaram a fazer seu nome em solo ianque. Enquanto isso, a banda já começava a se estranhar. Esse negócio de Bob Marley and The Wailers pegou mau pro Bunny Wailer e pro Peter Tosh. Ego inflado + grana entrando. Já viu, né? De qualquer forma, a banda continuou produzindo. Ainda no final de 1973 a banda lança o segundo disco, Burnin’. O disco que fez realmente tudo mudar. Este disco caiu nas mãos de Eric Clapton, que chapou no som e acabou regravando I Shot the Sheriff. Foi quando o nome de Bob Marley se tornou conhecido mundialmente.

Daí em diante, foi só ladeira (e fumaça) acima. Claro que o trio fundamental, Marley, Wailer e Tosh, se dissolveu em meio a muita treta. Bob Marley, malandramente, acabou mantendo o nome Bob Marley and The Wailers em seus discos, mesmo sem Bunny Wailer e Peter Tosh. Entre 1973 e 1981 foram 11 discos lançados, todos com sucesso estrondoso no mundo todo. Bob Marley se tornou um proeminente ativista pelos direitos humanos e pela paz, tendo sido inclusive baleado num atentado na Jamaica. Mas não foi isso que o matou, mas sim sua teimosia. Em 1977 ele machucou o pé jogando futebol. Ficou com uma ferida feia no dedão do pé. Ferida essa que ele não cuidou. Talvez ele tenha esquecido… Enfim.  Só em 1980 que foi atrás de saber porque aquele machucado no dedo não sarava nunca. Acabou sendo diagnosticado com um raro melanoma. A solução era amputar o dedo. Mas Bob não topou. Temia que isso prejudicasse sua performance no palco, onde ficava em pé e dançava por horas. Além do mais, a crença rasta valorizava muito o corpo, e uma amputação ia contra esses conceitos.. No fim, o tal melanoma evoluiu para um câncer que se espalhou pelo corpo de Marley e acabou o matando em 11 de maio de 1981.

Photo by Dennis Morris

Vamos finalizando, porque esse texto já está enorme. Uma pena, porque a vida do Bob Marley é cheia de histórias incríveis e interessantes. Desde o atentado que ele sofreu na Jamaica por querer fazer um show gratuito para apaziguar os ânimos políticos do país, até sua breve passagem pelo Brasil onde teve seu visto de trabalho negado pelos militares e jogou uma pelada com Chico Buarque, Alceu Valença e Moraes Moreira. Sem falar que ele espalhou pelo mundo o reggae como forma de música de protesto, que foi incorporada pelos punks ingleses, em especial o The Clash. Mas quem sabe essas histórias não pintam por aqui numa outra oportunidade, né? Afinal, o Bob Marley tem tudo a ver com tudo que a Strip Me mais acredita e ama: Engajamento, personalidade, diversão e arte!

Vai fundo!

Para ouvir: Claro, uma playlist delícia com o que há de melhor na obra do Bob Marley, mas dando aquela desviada das obviedades. Top 10 tracks do Rei do Reggae.

Para assistir: Eu sei que não tem tanto a ver com o Bob Marley em si, mas eu acho que é um filme tão divertido e que traz tanto dessa aura jamaicana, além de ser um filme muito subestimado. Estou falando de Jamaica Abaixo de Zero, filme lançado em 1993 sobre a improvável equipe de trenó que disputou as Olimpíadas de Inverno do Canadá de 1988.

Para ler: O ótimo livro No Woman No Cry – Minha vida com Bob Marley, escrito pela esposa de Bob, Rita Marley e lançado no Brasil em 2019 pela editora Belas Letras. Uma narrativa detalhada e fluente sobre a trajetória de Bob Marley, tanto pessoal como profissionalmente.

Well, whatever… Nevermind.

Well, whatever… Nevermind.

 Um dos vídeos mais famosos do Nirvana é uma filmagem amadora de um show da banda em Dallas numa pequena casa de shows. O show foi um caos, vários problemas técnicos, PAs falhando e etc. Sem falar que o som do Nirvana sempre foi barulhento, abusando de microfonias. Eis que durante a música Love Buzz, na hora do solo de guitarra, Kurt Cobain faz um stage dive com guitarra no lombo e tudo. Ele está lá curtindo, se debatendo em cima da plateia, quando um dos seguranças o puxa de volta para o palco. Mas ele não quer ir, e, no reflexo, enfia a guitarra na testa do tal segurança. Quando Kurt volta ao palco, o segurança com a cabeça sangrando tá full pistola e já chega no soco e na bicuda pra cima dele e o caos se instaura. Nem o mais otimista dos seres humanos que visse este vídeo antes de setembro de 1991 acreditaria que aquela banda seria capaz de desbancar Michael Jackson na lista dos discos mais vendidos do ano.

A música pop produziu os mais variados fenômenos da década de 1950 pra cá. Um branco do sul dos Estados Unidos que misturou country com música negra, 4 moleques de uma cidadezinha portuária da Inglaterra que faziam músicas de amor e aposentaram a fase dos topetes no rock, um inglês que imortalizou sua imagem com um raio na cara e uma música plural e por aí vai. Mas nenhum desses fenômenos foi tão radical quanto a ascensão da banda Nirvana. Por mais que Elvis tenha sido um revolucionário misturando o country dos brancos com o R&B dos negros, o cenário musical estava pronto para isso. Os Beatles foram uma evolução natural daquele movimento que já contava com Buddy Holly e Little Richards. Bowie foi um gênio justamente por saber ler o que havia de melhor na vanguarda da música pop e recriar à sua maneira. Em nenhum desses casos houve ruptura. Com o Nirvana foi diferente.

Photo by: Michael Lavine

Até dá pra dizer que o rock estava em evidência em 1991. Mas era um rock afetado, narcisista. Guns n’ Roses lançava o megalomaníaco Use Your Illusion I e II, U2 se rendia ao pop em Atchung Baby e no front do rock mais pesado, o Metallica se rendia a baladas e mais melodias do que agressividade no clássico Black Album. O punk rock estava esquecido. A música alternativa, que sempre foi efervescente, vale dizer, continuava de boa ali no underground sem incomodar ninguém.  Pra não falar que não rolava rock alternativo no mainstream, o clipe de Losing my Religion, do R.E.M. estava bombando e o Sonic Youth tinha lançado Goo, um disco bem sucedido por uma grande gravadora, um ano antes.

Photo by: Kirk Weedle

Aliás, foi por causa do Sonic Youth que o Nirvana acabou assinando com a Geffen Records. Dizem que o pensamento dos executivos da gravadora era o seguinte: se o Sonic Youth vendeu 50 mil discos, o que eles consideravam um bom desempenho para uma banda alternativa, se o tal Nirvana vendesse igual ou um pouco mais, já valia a pena. Acontece que em dezembro de 1991, três meses depois de lançado, Nevermind já vendia 300 mil cópias por semana! Tudo por causa de um riff de guitarra grudento, uma letra reclamona e um clipe poderoso.

Photo by: Kirk Weedle
Photo by: Kirk Weedle

Nevermind é um disco brilhante e irretocável. Ali estão as melhores composições de Kurt Cobain, executadas por uma banda afiadíssima, um baixo marcante e preciso, uma bateria cavalar, harmonias incríveis e uma produção soberba. É um monte de elogios grandiosos, eu sei, mas não é exagero. Apesar de estar recheado de hits, o disco foi puxado por Smells Like Teen Spirit. Uma música que Kurt Cobain escreveu inspirado nos Pixies com sua dinâmica de guitarras distorcidas, verso suave e explosão no refrão. O clipe reforçava a letra da música, que reclamava da apatia juvenil, apresentando uma mini rebelião num ginásio de colégio com cheerleaders com o símbolo da anarquia punk estampado em suas blusas. Era tudo que uma juventude cansada de bandas super produzidas e astros pop inatingíveis precisava.

Photo by: Michael Lavine

A honestidade, o sarcasmo e principalmente as músicas excelentes do Nirvana caíram nas graças do mundo pop. Nevermind tirou Michael Jackson do topo dos discos mais vendidos e chutou a porta para um mundo desconhecido entrar. De uma hora pra outra, roqueiros maltrapilhos, de cabelos ensebados e usando bermudas e camisas de flanela passaram a frequentar capas de revistas e ter seus discos entre os mais vendidos. Na real, a maioria das bandas que apareceram como grande novidade da música já eram veteranos, com pelo menos três ou quatro discos já lançados na bagagem. Mudhoney, Pixies, Sonic Youth, Soundgarden, Screaming Trees, L7… essa turma toda já estava na ativa desde os anos 1980.

O Nevermind é o disco mais importante da década de 1990, e completa neste ano 30 anos de lançado. Responsável por uma revolução na música e no comportamento. Não se trata só de um disco com 12 músicas ótimas. Trata-se do disco de uma banda que sempre que podia, falava bem de outras bandas, que tinha personalidade e muito talento. Nevermind é a obra prima, mas tudo que o Nirvana lançou é bom demais. Bleach, Incestcide, In Utero, Unplugged in NY, os singles, discos ao vivo, bootlegs… não tem coisa ruim. É por isso que a morte de Kurt Cobain em 5 de abril de 1994 ainda é sentida e lembrada até hoje. E enquanto existirem jovens descontentes com guitarras na mão, continuará sendo.

Photo by: Charles Peterson

Vai fundo!

Para ouvir: Todo mundo conhece os clássicos do Nirvana. Mas tem muita coisa nas beiradas de toda a obra da banda que é genial e merece ser ouvida. Por isso, fizemos um top 10 tracks Nirvana que fogem do óbvio.

Para assistir:Tem muito material interessantíssimo sobre o Nirvana. Vou citar dois: Primeiro o home vídeo Nirvana Live! Tonight! Sold Out! que conta toda a trajetória da banda até a morte prematura de Kurt Cobain. O outro é o documentário Montage of Heck, que se presta a contar a história do Kurt Cobain através de sua própria obra e com vídeos e gravações cedidos pela família. Inclusive a produção é assinada pela Frances Bean Cobain, filha de Kurt.

Para ler: Claro! A indispensável biografia de Kurt Cobain  Heavier than Heaven, escrita pelo jornalista Charles R. Cross. Um livro completíssimo, super bem escrito e delicioso de se ler. Livro essencial para quem gosta de música.

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